Deputados da oposição e situação se revezam na tribuna para discutir projeto que concede trechos rodoviários à iniciativa privada por até 30 anos|Foto: Guilherme Santos/Sul21
Jaqueline Silveira
O debate sobre o projeto de concessão de rodovias gaúchas à iniciativa privada foi retomado na sessão na tarde desta terça-feira (10) da Assembleia Legislativa e se arrastou por quase sete horas. A proposta, que prevê a concessão das estradas por até 30 anos, começou a ser discutida na sessão da última terça (3), mas foi interrompido com o encerramento da sessão por falta de quórum, já que não havia consenso sobre o projeto, inclusive, na base aliada do governo José Ivo Sartori (PMDB). Ao final, a Assembleia Legislativa aprovou, por 32 votos favoráveis contra 13 contrários, o projeto de lei do governo do Estado (PL 47 2016), que autoriza o Executivo a conceder, pelo período de 30 anos, os serviços de exploração das rodovias (operação, conservação, manutenção, melhoramentos e ampliação da infraestrutura), bem como da infraestrutura dos transportes terrestre das rodovias estaduais. Estabelece, ainda, que o valor das tarifas pagas pelos usuários será definido em licitação, do tipo menor preço, na busca da menor proposta, e que caberá ao Daer a fiscalização da execução dos contratos e a análise dos projetos de engenharia.
Emendas
Das 27 emendas recebidas, seis foram aprovadas juntamente com o projeto, em razão da aprovação do pedido de preferência do líder do governo. As demais, foram consideradas prejudicadas. Veja as emendas aprovadas ao PL 47/2016:
— Emenda 3, do deputado Ronaldo Santini (PTB), estabelecendo que a concessão será formalizada através de Termo de Contrato decorrente de procedimento licitatório, na modalidade de concorrência pública, que deverá prever a possibilidade de participação de pessoas jurídicas brasileiras e estrangeiras.
— Emenda 6, do deputado Frederico Antunes (PP), prevendo que nos contratos de concessões de rodovias integrantes do sistema rodoviário estadual, poderá no edital ser incluída a conservação de rodovias transversais às concedidas.
— Emenda 16, do deputado Elton Weber (PSB), estabelecendo que a revisão do contrato dar-se-á periodicamente e sempre que necessário para apurar e corrigir eventuais desequilíbrios na equação econômico-financeira, nos termos do ato expedido pela Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do RS – Agergs, que também aplicará sanções.
— Emenda 23, do deputado Eduardo Loureiro (PDT) e outros dez parlamentares, prevendo o estabelecimento, por decreto governamental, em 90 dias, do marco regulatório, que deverá ser antecedido de consulta pública, no prazo de 45 dias após a publicação da lei.
— Emenda 24, do deputado Eduardo Loureiro (PDT) e mais nove parlamentares, pela qual o governo publicará e comunicará à Assembleia, com antecedência de 60 dias à publicação do edital de licitação, ato justificando a conveniência da outorga da concessão ou permissão, caracterizando seu objeto, área, prazo e tarifa-base.
— Emenda 25, do deputado Alexandre Postal (PMDB) e outros nove parlamentares, prevendo postos de pesagem de veículos nos trechos a serem concedidos.
O debate
Oposição e governo travaram um longo e acalorado debate. De um lado, a base do governo Sartori argumentou que as concessões são necessárias para investir em melhorias nas estradas, e que o modelo proposto é semelhante ao adotado pelo governo federal. A oposição, por sua vez, questionou o prazo de 30 anos e a falta de um marco regulatório com critérios claros para as concessões, considerando o projeto "um cheque em branco" a Sartori. Logo no início da discussão, o deputado Enio Bacci (PDT) avisou que sem aprovação das duas emendas apresentadas por sua bancada votariam contra. Uma das propostas garante o marco regulatório, e a outra prevê a publicação do edital de licitação 60 dias antes para que as comunidades possam ter tempo para discutir as concessões.
Em sua manifestação, o petista Tarcisio Zimmermann disse que projeto atual é "mais danoso" à sociedade gaúcha, comparado ao modelo implantado pelo governo Antonio Britto na década de 90. Na época, o prazo de concessão foi de 15 anos. Zimmermann esclareceu que os prazos são mais longos e não há regras claras para as concessões, já que não está previsto o marco regulatório. "Esse projeto do governo Sartori é pior do que o do governo Britto, os prazos são mais longos e as condições não são explícitas", justificou ele, sobre o voto contrário da bancada do PT ao projeto.
Em resposta ao pronunciamento de Zimmermann, o deputado Frederico Antunes (PP) afirmou que o petista "peca" ao fazer comparações "que não são felizes" entre pessoas do mesmo partido, declarando sua admiração a Britto. "No meu ponto de vista, foi um dos melhores governadores do Rio Grande do Sul", acrescentou ele sobre Britto. Antunes frisou que uma das emendas inclui a participação da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) na fiscalização das concessões. "O texto do edital será norteado pelo marco regulatório", afirmou o deputado, sobre a maior reclamação da oposição e também de alguns deputados da base aliada sobre a falta de critérios para conceder os trechos das rodovias.
Farpas lá e cá
Também da base aliada, os parlamentares Gilberto Capoani (PMDB) e Sérgio Turra (PP) fizeram pronunciamentos irônicos em relação à oposição, principalmente ao PT, disparando críticas ao governo Dilma Rousseff (PT). O governo federal, conforme Capoani, criou vários impostos, contudo critica a criação de pedágios. "É Esse o PT que não gosta de pagar imposto", ironizou o peemedebista, acrescentando que não é por acaso que a presidenta Dilma "sairá pela porta dos fundos", referindo-se ao processo de impeachment autorizado pela Câmara dos Deputados e que está em análise no Senado.
A criação da Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) no governo Tarso Genro, na opinião de Capoani, é que foi "um cheque em branco", já que deu poderes "eternamente" para a EGR definir os pedágios e as rodovias. "É óbvio que pagar pedágio não é bom. Quanto maior o tempo das concessões, menor a tarifa do pedágio. Essa que é a verdade, o resto é falácia e demagogia", criticou o deputado Turra, ressaltando que o importante é a fiscalização do Estado sobre o trabalho das concessionárias.
Deputada Manuela: 'Perto de Sartori, Britto foi tímido'| Foto: Guilherme Santos/Sul21
A resposta do PT não demorou. "Especialista em aumentar impostos, arrochar salários é o PMDB", rebateu o deputado Adão Villaverde (PT), sobre o aumento do ICMS proposto e aprovado pelo governo Sartori, em 2015. Da oposição, a deputada Manuela D'Ávila (PCdoB) fez uma das manifestações mais contundentes. Ela afirmou que os integrantes da base aliada preferem abordar o governo Dilma porque "não querem debater a concessão de 30 anos no escuro." "A política de concessão não pode ser no escuro por 30 anos, sem controle público. Perto de Sartori, Britto foi tímido: não teve coragem de dispensar a Assembleia", alfinetou Manuela, sobre o modelo proposto pelo Piratini que, se aprovado, cada concessão não precisará passar pelo aval do Legislativo. "Daqui pra frente, tudo será por decreto", completou o deputado Zé Nunes, do PT.
Ao contrário do que afirmou a oposição, a base aliada insistiu que o modelo de concessão adotado no Estado é semelhante ao do governo federal. Dos 54 trechos federais entregues à iniciativa privada, de acordo com o peemedebista Vilmar Zanchin, 41 têm mais de 20 anos de concessão. "(O projeto) Não saiu da cabeça do governador, foi sim utilizado como base na elaboração a legislação federal", argumentou Zanchin. "Nenhum trecho concedido passa para a homologação do Congresso Nacional", completou ele, em resposta à oposição que cobra a análise de cada concessão pela Assembleia. Do PSOL, Pedro Ruas criticou o pouco tempo para avaliar uma proposta desse impacto. "Não se faz um projeto dessa natureza num prazo tão exíguo e da forma como está", alertou ele.